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quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Por que votar em Luciana Genro

Um governo que defenda os interesses do povo brasileiro e não de um pequeno grupo tem que mobilizar esse povo a pressionar o Congresso Nacional.
lucianagenro
Quando o Amálgama solicitou esta contribuição, a primeira resposta que me veio à cabeça foi: “Bom, votarei em Luciana Genro porque sou militante do PSOL e acredito neste projeto partidário, necessário nestes tempos difíceis”.
O sistema eleitoral que autoriza a profusão de legendas de aluguel; a generalização da lógica daRealpolitik, que levou a maioria dos partidos no Brasil a ser apenas uma sopa de letrinhas de siglas distintas com projetos muito parecidos – como se verifica nas coligações esdrúxulas que o povo brasileiro assiste em todas as eleições nos últimos 20 anos, baseadas no objetivo de mais espaço no horário eleitoral e, em decorrência, mais parlamentares; as semelhanças cada vez mais profundas entre partidos como PT e PSDB e as “alternativas” autointituladas representação da “nova política” com um discurso e programa conservadores; a corrupção sistêmica; tudo isso resultou num questionamento generalizado às instituições e nas multitudinárias manifestações de junho de 2013.
E até o momento a esquerda que não se adaptou ainda busca caminhos para dialogar com o difuso sentimento de negação do que aí está, com vistas à afirmação de um projeto efetivamente alternativo.
A candidatura de Luciana representa essa busca. E essa é a verdadeira razão de empenhar a ela meu voto. Fosse candidato do PSOL o senador Randolfe Rodrigues, apesar de acreditar da mesma forma no projeto da legenda que se constituiu para resgatar a proposta do Socialismo com Liberdade, não votaria nele. Pela primeira vez votaria nulo no primeiro turno das eleições presidenciais.
Embora desempenhe papel importante no Senado, Randolfe meteu os pés pelas mãos ao associar-se, ainda que formalmente, à base do governo federal para garantir algum espaço em comissões daquela casa legislativa; exagerou na dose ao declarar pensar em compor ministério com quadros do atual governo e engrossar o “volta, Lula!” anunciando que renunciaria à candidatura caso o ex-presidente decidisse disputar este pleito; e passou dos limites na tentativa de posar como republicano, deixando-se fotografar com o candidato tucano e ainda tecendo loas à biografia de Aécio. Tais atitudes evidenciavam pouca vinculação com a Agenda Pós-Junho/2013 e pouco apreço ao projeto do PSOL, confirmados pela brusca retirada da candidatura após conflagrar internamente o partido para impor seu nome como candidato no último congresso da agremiação.

A mudança que o Brasil precisa

Entre as candidaturas à frente nas pesquisas fala-se muito em mudanças, mas a verdadeira mudança que o país precisa não é defendida por nenhuma delas:
Controle de capitais. Ruptura com o tripé câmbio flutuante-superávit primário-metas de inflação, que mantém o país vulnerável à especulação financeira e dependente da exportação de commodities. Auditoria da dívida pública com suspensão do pagamento de juros e amortizações – à exceção dos pequenos poupadores – para liberar espaço no orçamento da União para investimentos. Controle do Banco Central pelo Estado, a fim de assegurar a soberania da política econômica. Reforma tributária que acabe com a regressividade dos impostos no país, onde quem ganha menos paga mais e quem tem milhões ou sonega ou paga muito pouco. Tributação sobre os rendimentos do capital maior que a tributação sobre os rendimentos do trabalho, e maior taxação do estoque de riqueza dos ricos.
Só essas medidas podem realmente inverter as prioridades do país e fazer com que o Brasil pare de definir o destino de seu povo aos cinco, seis anos de idade – quando um menino ou menina entra numa escola pública e outro entra na educação privada. Aí, como ressaltava nosso saudoso Plínio de Arruda Sampaio, começa a desigualdade abissal que temos no país e que vai se alargando com os anos.
A inversão de prioridades entre o pagamento de juros e o verdadeiro desenvolvimento do país permitirá uma política de geração de empregos para além da faixa de até três salários mínimos. Só com a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais sem redução salarial, por exemplo, seria possível gerar mais de 3 milhões novos postos de trabalho. E, segundo o Dieese, o impacto dessa política nos custos totais das empresas seria de apenas 1,99%, sendo que o aumento da produtividade do trabalho entre 1988 e 2010 foi da ordem de 92,7%.
Para o Brasil mudar efetivamente para melhor tem que ser prioridade do país encerrar o que Plínio de Arruda Sampaio qualificava como Bolsa Banqueiro – a destinação de 42% do orçamento da União para juros e amortizações da dívida enquanto apenas 4% vão para a saúde, 3,5% para a educação e 1% para o Bolsa Família (ver gráfico).
orcamento2014

Por mais direitos

O programa de Luciana Genro também estabelece que ações como o Bolsa Família “devem ser transformadas em políticas efetivas de transferência de renda, tratadas como política de Estado e acompanhadas por transformações estruturais, pois isoladas são meramente paliativas e insuficientes para assegurar a vida digna que todos merecem”. Nenhum outro candidato propõe a conversão deste programa em direito, num outro patamar de política social, porque isso seria o fim do proselitismo utilizado em época eleitoral para garantir o voto de quem depende desse dinheiro, com base no medo de perdê-lo caso mude o comando do país.
O salário mínimo, apesar do aumento real verificado nos últimos anos, ainda está muito abaixo do mínimo necessário apontado pelo DIEESE. E, como também dizia Plínio, quem defende com unhas e dentes os atuais valores do salário mínimo deveria viver com este valor. Sem falar da desvinculação do reajuste das aposentadorias ao salário mínimo, que vem penalizando os milhões de brasileiros que dedicaram anos a fio à construção da riqueza nacional. Uma política de seguridade social necessária ao Brasil tem que pôr fim também ao fator previdenciário e anular a reforma previdenciária de 2003 – aprovada em meio ao esquema que ficou conhecido como “mensalão”. E é o programa de governo de Luciana Genro e do PSOL que propõe avançar em tais medidas.
Para tudo isso, um governo que defenda os interesses do povo brasileiro e não de um pequeno grupo tem que mobilizar esse povo a pressionar o Congresso Nacional – que deveria representar os interesses dos brasileiros e não dos financiadores de campanhas – para aprovar uma reforma política real. Pelo fim do financiamento privado das campanhas; por um sistema eleitoral que não continue alijando mulheres, negros e outros setores sociais; para que se cumpra a Constituição e o povo seja chamado a efetivamente decidir sobre as grandes questões nacionais por meio de plebiscitos e referendos; pela introdução da revogabilidade de mandatos e fim do foro privilegiado. A governabilidade não pode ser sustentada nos jogos palacianos por maioria parlamentar. O parlamento e o governo devem estar a serviço do povo, e não o contrário como historicamente vemos no Brasil.

A agenda dos direitos humanos

O combate à homofobia e o fim da criminalização das mulheres que necessitam interromper uma gestação indesejada são políticas de direitos humanos e de saúde pública que jamais serão efetivadas enquanto se trocarem votos por apoio de bancadas religiosas. O Estado brasileiro é constitucionalmente laico e não pode continuar submetido a grupos religiosos que não representam a diversidade populacional, por maiores que sejam.
Da mesma forma, o enfrentamento ao racismo tem que começar a se efetivar a partir das instituições do Estado – com o fim da militarização das polícias e da política de estado penal que encarcera mais de 500 mil brasileiros, 60% negros. Ao invés de reduzir a maioridade penal, o Brasil tem que aumentar o número de vagas em creches, escolas e universidades públicas de forma a garantir a universalização do acesso prevista na Constituição. É preciso também institucionalizar a política de cotas na educação e nos serviços públicos, porque a Constituição de 1988 estabelece que somos todos iguais, mas os negros são até hoje vítimas dos 388 anos de escravidão e do racismo que estrutura a sociedade brasileira. Democracia é tratar de forma desigual os que estão em condições distintas em razão do processo histórico e social em que vivemos, até que essas disparidades se esgotem e sejamos todos os brasileiros efetivamente iguais em direitos.
Para tudo isso, enfrentar a agenda da democratização dos meios de comunicação tem que ser outra prioridade de governo. Todas as nações democraticamente consolidadas regulam os meios de mídia. Aliás, até nos Estados Unidos a mídia é regulada e um mesmo grupo não pode ser dono de jornais, TVs, rádios, revistas, sites e provedores de acesso como acontece no Brasil.

Um voto realmente útil

Não é verdade que vai tudo bem com o Brasil. Basta ver o pífio crescimento do PIB nos últimos dois trimestres, que especialistas já apontam como recessão. Somos o sétimo país mais rico do mundo e o 85º em desenvolvimento humano. Além disso, 51% dos brasileiros ainda vivem sem coleta de esgoto em pleno século XXI, segundo estudo recentemente divulgado pelo Trata Brasil. O país ocupa o 7º lugar no mundo em assassinatos de mulheres (dados do Mapa da Violência 2012, do Instituto Sangari). E no ano passado 312 homossexuais foram mortos por razões homofóbicas, segundo levantamento realizado pelo Grupo Gay da Bahia. Os jovens negros ainda têm 3,7 vezes mais chances de morrerem de forma violenta que um rapaz branco na mesma faixa etária, conforme aponta estudo sobre o racismo no Brasil divulgado em outubro do ano passado pelo Ipea (órgão vinculado ao governo federal). E o mesmo relatório aponta que as mulheres negras são 60% das vítimas de mortes violentas.
O portal Fora da Escola Não Pode!, apoiado pelo Unicef em parceria com a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, informa que mais de 3,8 milhões de crianças e adolescentes entre 4 e 17 anos estão fora da escola. A saúde pública não é um direito para todos, tendo em vista a quantidade de pessoas que morrem esperando um exame ou cirurgia. Até hoje não houve reforma agrária em nosso país.
Então não é possível que o voto considerado útil seja aquele que ajuda a eleger candidatos melhor colocados em pesquisas de opinião. Para que meu voto seja efetivamente útil, deve refletir o que penso que deve mudar no país, a fim de não me arrepender lá na frente.

Luciana Genro: porque é preciso coragem e coerência para garantir os direitos do povo

Cria do movimento estudantil, que já legou ao país centenas de lideranças políticas, ainda no Rio Grande do Sul, Luciana foi eleita deputada estadual pela primeira vez em 1994 e reeleita em 1998, pelo Partido dos Trabalhadores. De 2003 a 2011 exerceu mandato de deputada federal, primeiramente pelo PT e depois pelo PSOL. Sua saída do PT foi a culminação de uma série de enfrentamentos contra a adaptação daquele partido à ordem, desde a Carta aos Brasileiros até a reforma da Previdência de 2003.
Dedicada militante socialista, professora, advogada e mãe, Luciana merece meu voto.

Fonte: http://www.amalgama.blog.br/09/2014/por-que-votar-em-luciana-genro/

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