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quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Livro - Densidade Urbana

Livro - Densidade Urbana - Um instrumento de planejamento e gestão urbana

Claudio Acioly & Forbes Davidson


Prefácio

Ao reorganizar o Programa de Auxílio para a Cooperação ao Desenvolvimento, em 1995, o governo sueco decidiu criar um novo departamento para lidar especificamente com a questão do desenvolvimento urbano. Essa mudança acabou reforçando a importância das cidades no seio da política sueca para o desenvolvimento internacional, enfatizando o seu papel como centro dinâmico de crescimento e ao mesmo tempo como foco de um esforço humano coletivo para o desenvolvimento.

O presente trabalho é uma tradução ampliada do texto editado na série “Building Issues” que integrou a contribuição sueca à Segunda Conferência das Nações Unidas sobre os Assentamentos Humanos, Habitat II, realizada em Istambul em 1996.

O objetivo principal desse trabalho é destacar problemas atuais no seio das operações e atividades levadas a cabo pela SIDA (Agência de Desenvolvimento e Cooperação Internacional Sueca) nos países em desenvolvimento. Espera-se que essas experiências sirvam como recomendações e diretrizes dentro de cada matéria específica e propiciem informação e conhecimentos úteis àqueles que lidam com a problemática urbana em países em desenvolvimento.

1- Introdução

Ainda hoje os urbanistas e planejadores urbanos defrontam-se com um dilema fundamental sobre o tamanho, a forma e o padrão de crescimento que as cidades devem assumir no séc. 21. De um lado encontramos as cidades compactas, densamente ocupadas e verticalizadas.
Do outro as cidades amenas, “verdes”, tranqüilas e menos densas.

Quaisquer umas das duas trazem consigo uma série de impactos ao meio ambiente urbano, e na qualidade, intensidade e singularidade da vida e convívios urbanos. O debate ocorrido durante a conferência Habitat II conclui e alertou que nossas cidades não poderão crescer linearmente e indefinidamente sobre o seu entorno natural, sem colocar em risco os recursos naturais essenciais a sua própria existência e sustentabilidade. O desenvolvimento sustentável e duradouro necessariamente exigirá uma reformulação de nossa visão de cidade e de nossos padrões de urbanidade.

O Problema
A densidade do desenvolvimento urbano é um assunto controverso e muitas vezes confuso. Decisões tomadas nessa área podem ter um impacto significativo na saúde, meio ambiente, na produtividade das cidades e no processo de desenvolvimento humano como um todo.

Devido a tudo isso, a sustentabilidade e durabilidade do desenvolvimento dos assentamentos humanos dependem em parte de como planejadores urbanos, arquitetos, projetistas de cidades, gerentes urbanos e agentes decisórios percebem e decidem sobre os benefícios intrínsecos e as desvantagens existentes em meios ambientes urbanos densamente ocupados.

O Objetivo

Os objetivos desse estudo são:
· Esclarecer as decisões interconectadas com a densidade urbana;
· Rever experiências e estudos de casos onde a densidade assume uma importância particular no processo de desenvolvimento urbano;
· Identificar as variáveis mais importantes que ligam a densidade à performance urbana;
· Oferecer uma gama de pontos de referência, ferramentas e diretrizes que possam auxiliar nas decisões sobre densidade urbana, particularmente para assentamentos de baixa renda;

O estudo reconhece que percepção sobre densidade varia imensamente de um país para outro e mesmo entre cidades de um mesmo país.

O Método
A análise de mais de 12 casos, alguns dos quais estão resumidos na forma de quadros, ajudou a criar uma base para comparações.Esse exercício foi complementado por uma análise da literatura existente. Os autores optam por oferecer diretrizes, referências, um “checklist” e recomendações para tomada de decisões, ao invés de soluções prontas e valores de densidade ideais.

Organização e Estrutura do Estudo

O capítulo 1 descreve o problema e os objetivos do trabalho. O capítulo 2 trata da conceitualização da densidade, como ela é compreendida e as principais implicações e impactos ao nível do lote , bairro, saúde e produtividade urbana. O capítulo 3 enfoca os processos de planejamento e desenho urbano em relação à densidade.

O capítulo 4 trata dos aspectos legais e de gestão da densidade urbana, e sublinha como regulamentações e aplicações da lei possuem um papel potencial importante nos sistemas de gestão urbana. Analisa-se a habilidade e vontade políticas dos principais agentes urbanos públicos e privados em reforçar a aplicação das regulamentações e Standards ligados à densidade.

O estudo de caso e experiências com densidade são apresentados sob a forma de “boxes” ou quadros. Eles são utilizados como referências que refletem determinadas abordagens ou aspectos tratados ao longo do trabalho.


Considerações Gerais
Mesmo dentro de um mesmo país, grupos sociais diferentes irão perceber a questão da densidade diferentemente. O que as pessoas sentem ou vêem depende muito de suas próprias origens sociais, econômicas e étnicas, e, até certo ponto, da configuração, forma e uso da construção e do espaço urbano.

A densidade é um dos mais importantes indicadores e parâmetros de desenho urbano, expressa em habitantes por uma unidade de terra. A densidade serve como um instrumento de apoio à formulação e tomada de decisões por parte dos planejadores.

Especialistas em habitação tem assumido que, quanto maior a densidade, melhor será a utilização e maximização da infra-estrutura e solo urbano. Entretanto, devemos ser cautelosos, pois assentamentos humanos de alta densidade podem também sobrecarregar e mesmo causar uma saturação das redes de infra estrutura e serviços urbanos e um meio ambiente superpopuloso e inadequado ao desenvolvimento humano.

O tamanho do lote, o total de sua área que pode ser ocupada e a altura da sua construção a ser erguida em relação ao total da área a ser construída, revelam as dimensões mais visíveis da densidade. Isso é determinado durante a fase de desenho do projeto e que pode ser reforçado e controlado no planejamento. Entretanto, isto não significa uma garantia de que o planejado será executado como tal.

Muito estreitamente ligado a densidade está o conceito de superocupação (“crowding”) ou superaglomeração que implica dizer que uma quantidade excessiva de pessoas vive, trabalha ou ocupa um determinado bairro, lote, residência ou quarto. Os estudos recentes revelam uma forte correlação entre altas densidades populacionais e a precária situação de saúde dos habitantes sujeitos à situação de “crowding”.

Existem muitos fatores influenciando a densidade. Com alguns podemos lidar diretamente, com outros, indiretamente e com outros ainda, muito pouco ou quase nada. A situação mais comum em que a densidade deve ser considerada é quando um novo empreendimento (assentamento ou loteamento, uma expansão ou renovação urbano), está sendo planejado. A decisão poderá ser direta quando a responsabilidade pela implementação é do governo e indireta quando promovido pelo setor privado. Isso se concretizará através de regulamentação e negociação.

A Densidade Urbana na Cidade de Bissau, Guiné-Bissau

O centro urbano planejado e muitas vazes denominado de centro colonial, é geralmente bem servido de infra-estrutura e serviços urbanos. Ao seu redor, entretanto, desenvolveu-se um processo urbanização predominantemente informal. Esse fenômeno está diretamente ligado a dois fatos: a desestruturação institucional e política do setor Habitacional e a total falta de uma legislação básica capaz de fomentar a atividade do mercado imobiliário formal e estimular a produção de espaço residencial e a fragilidade das estruturas e instituições públicas responsáveis pela gestão e planejamento urbano.

A densidade populacional varia entre 204 e 400 habitantes/ha e a densidade habitacional de 14 a 18 casas/há, variando entre 10 e 22 habitantes por casa. Pode-se classificar essa densidade como “crowding”.As densidades urbanas estão alcançando limites alarmantes e colocando em risco a saúde física e mental da população.

A Densidade Urbana em Hong Kong

Hong Kong passa por uma situação em que detém a maior a densidade urbana do mundo. Em 10% da área total do seu território vive 80% da população, chegando em alguns conjuntos residenciais a alcançar 5858 hab/ha. Isso se justifica por uma intensa ocupação do solo, pela tipologia da habitação multifamiliar, por altas taxas de ocupação de solo e por prédios residenciais que variam de 20 a 30 pavimentos de altura, esse último surgiu de uma política governamental em 1954, baseada no princípio da economia na utilização da terra urbana disponível, considerada como um recurso limitado.

Em 1988, o governo lançou um plano estratégico a fim de baixar a densidade populacional no território. Para 2011, a meta é que a densidade bruta baixe até 460 hab/ha. e nas áreas de alta densidade residencial diminua até 1900 habitantes/ha., o que significa uma diminuição de ocupação do lote. Contra essa descentralização manifesta-se o grupo econômico e o ambiental, afinal as áreas que capacitam Hong Kong de produzir sua própria alimentação pode ser destruída.

Fatores que influenciam a densidade urbana:

· Disponibilidade de solo urbano;
· Layout do assentamento e equilíbrio entre público e privado;
· Tipologia habitacional;
· Tamanho e forma dos edifícios;
· Legislação de planejamento;
· Tamanho e dimensão do lote;
· Standards das ruas, infra-estrutura e transporte,
· Tamanho da família.

Quando se opta pelo reassentamento em áreas fora do assentamento, como é o caso de uma reestruturação urbana em bairros de assentamento informal em que há o terreno ou solo urbano disponível para ocupação não é suficiente, devemos ser cautelosos para que não tenha sérias implicações sociais e econômicas para a população, apesar de poder aliviar a densidade populacional e a densidade construída.

Dependendo da localização do assentamento em relação aos centros e locais de serviços e empregos, o valor da terra tenderá a estimular aumentos na taxa de ocupação e até mesmo mudanças nas regulamentações que regem a densidade.

Em várias cidades do mundo as áreas centrais são caracterizadas por uma alta densidade populacional por ter uma concentração de emprego e de atividades relacionadas ao setor terciário, o que demanda grandes somas de investimentos em infra-estrutura, enquanto que subúrbio periférico tem uma densidade baixa durante o expediente de trabalho e as áreas centrais permanecem subutilizadas após o fim do expediente de trabalho. Essa população flutuante tem que fazer longos deslocamentos casa-trabalho-casa, enfrentar engarrafamentos de trânsito, o alto consumo de energia e combustível. Essas questões irão determinar o grau de sustentabilidade do meio ambiente urbano.

A ausência de uma gestão urbana faz com que em locais com alta acessibilidade, serviços urbanos e altos níveis de infra-estrutura tenham uma densidade alta, o que também irá aumentar o custo da terra. Se não há alternativas de mercado ou soluções induzidas pelo governo à tendência é ter o aumento da densidade por mecanismos informais, como a verticalização ou expansão horizontal da construção ou aumento da taxa de ocupação dos prédios. Os governos locais podem intervir nesse fenômeno, estimulando, ao assumir um papel de facilitador e de agente monitor do mercado imobiliário, para isso deverão ter estudos sobre os potenciais de densificação e os impactos nas atividades e uso do solo, assim como dispor de um quadro de informações urbanas atualizado para poder subsidiar decisões que virão a aceitar alterações das taxas e índices de ocupação dos terrenos e das edificações.

Transporte, Densidade e Uso do Solo em Curitiba
O plano diretor de 66 tinha duas preocupações, o centro da cidade, descongestionar, revitalizar e preservá-lo e alterar o modelo de crescimento e urbanização da cidade, de um padrão radioconcêntrico para u linear, criando um eixo Norte-sul.

A estratégia era criar novos centros comerciais fora do centro, conectá-los com as áreas residenciais de alta densidade através do transporte público. A T.O. e o C.A. diminuem à medida que a distancia para os eixos de transporte aumenta.

A cidade ficou organizada num eixo trinário, contendo o eixo principal de transporte publico e duas vias de circulação com trafego em direções opostas a um quarteirão de distancia para cada lado do eixo principal. A circulação central é exclusivamente para o transporte público.

Com os prédios de valor arquitetônico e cultural ocorreu uma desapropriação branca onde a prefeitura oferecia outro terreno em troca desse numa área de maior interesse à obra em relação do planejamento da cidade, dando funções de interesse publico e cultural aos prédios adquiridos e por outro lado densificando outras áreas da cidade através de uma parceria pública-privada.

Um indicador importante da eficiência do uso do solo é aquele que informa a relação proporcional entre o espaço publico e privado utilizados/ocupados, a qual é comumente incluída na legislação de planejamento. As recomendações e sugestões incluídas na legislação geralmente tratam especificamente do aumento dos custos da infra-estrutura e manutenção em relação às alterações deste indicador e à densidade urbana resultante.

As baixas densidades requerem longas redes de infra-estrutura para poucos consumidores e, portanto, altos custos per capta na instalação e operação. Isso ocorre tanto em assentamentos de baixa renda onde impera a ocupação dispersa baseada em grandes lotes e habitações individuais, como em bairros de media e alta renda, mesmo quando planejados. No outro extremo encontra-se a congestão e a saturação das redes de infra-estrutura, gerando uma ineficiência urbana.

A baixa densidade permite a utilização de soluções localizadas de abastecimento de água e saneamento básico, oferecendo flexibilidade técnica e bases financeiras adequadas para um processo gradual de melhoria do sistema ao longo do tempo.

Em termos de saúde publica, baixas densidades facilitam o uso de sistemas de esgotamento ‘in loco’ sem grandes impactos ambientais e poluição, alem de reduz os riscos epidêmicos.

Em geral o fenômeno do crowding é diretamente ligado ao bem estar social, onde as variantes são inversamente proporcionais.


Densidade e o Custo da Rede de Esgoto em Natal

A solução mais barata encontrada, e de melhor funcionamento é a implantação nesses bairros mais pobres da rede de esgoto condominial.

Densidades, acessibilidade, transporte e proteção contra incêndios
Os assentamentos informais com alta densidade de ocupação registram incêndios, perda de propriedade e até de vidas humanas. Isto é causado pela combinação da densidade de ocupação do solo com os materiais de construção, as dimensões das ruas e espaços públicos e o comportamento dos agentes que interagem nesses locais.

O número de viagens por pessoa por automóvel individual/privado diminui a medida que as cidades e bairros tornam-se mais densos, o que permite economia no consumo de combustível e redução do impacto ambiental da urbanização.


Densidade e implicações sociais
Socialmente falando, baixas densidades de ocupação estão comumente associadas à alta renda dos habitantes, enquanto altas densidades estão geralmente associadas à baixa renda.

Os impactos da densidade urbana são influenciados pela qualidade do desenho urbano e pelo modo com que os moradores e usuários se comportam entre si em relação ao próprio ambiente urbano constituído. Novos empreendimentos e projetos de renovação e expansão urbana de baixas densidades foram realizados como uma reação às superlotação e congestionamento das áreas centrais e consolidadas da cidade (cidades – jardins).

Preocupações com relação à segurança e integridade física dos moradores tendem a fomentar a criação de ambientes urbanos com altas densidades. Distorções sociais e desigualdades econômicas estão de certa forma influenciando a estruturação do espaço urbano de muitas cidades e criando novos padrões de densidade e ocupação do solo.

Densidade, ambiente urbano e sustentabilidade do desenvolvimento urbano
Ambientes muito densos com pouco espaço livre e áreas verdes podem levar à fuga ou maior mobilidade da população residente. Entretanto, os assentamentos de baixa densidade, inspirados no modelo das cidades-jardins, consomem enormes glebas de terra para um número relativamente pequeno de habitantes, embora possam produzir ambientes bucólicos, como é o caso de Brasília onde nas áreas residenciais de alta renda os custos da urbanização são conseqüentemente altos e, em termos de gestão urbana, tais padrões de densidade e desenho urbano colocam-se como um dilema para performance da cidade e da sustentabilidade econômica desse modelo de urbanização.

O que está em questão é a possível degradação do meio ambiente urbano causada pelo processo de expansão urbana descontrolado. A “cidade sustentável” terá que surgir de uma prática do planejamento e gestão do meio ambiente urbano que leva em conta os aspectos ligados ao bem estar social dos habitantes e aos aspectos econômicos e financeiros intrínsecos as morfologias e tipologias das cidades. Isso implica flexibilização dos instrumentos de gestão e política urbana e implantação de um processo de planejamento dinâmico e alerta.


Postado por Juliana Tedaldi

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