Translate

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Conforto acústico nas edificações depende de nova cultura e ação integrada
Conforto acústico nas edificações depende de nova cultura e ação integrada
É necessário que todos os agentes envolvidos se empenhem no desenvolvimento de novos empreendimentos conformes à NBR 15575

Fundada há quase três anos, a ProAcústica – Associação Brasileira para a Qualidade Acústica – tem estado à frente dos debates sobre acústica ambiental e de edificações. Em entrevista ao Portal AECweb, Davi Akkerman fala das realizações da associação, das exigências que a ABNT NBR 15575 impacta no setor, e dos papeis de cada elo da cadeia para alcançar o melhor desempenho acústico.


AECweb - Qual foi a evolução da ProAcústica desde a sua criação?
Davi Akkerman - A entidade, criada oficialmente no final de 2011, conta atualmente com 66 associados, entre fundadores, efetivos e beneméritos. São 37 empresas fabricantes de produtos acústicos, 16 consultorias e projetistas e sete empresas de instalação e distribuição. Nestes três anos, a ProAcústica está se firmando como referência na área e tem estado à frente de todos os debates sobre acústica de edificações e ambiental. A associação vem cumprindo seus objetivos iniciais, de divulgar e promover a qualidade acústica nas edificações e meio ambiente, seja através da realização de eventos e palestras, ou ainda promovendo a formação de engenheiros, arquitetos e urbanistas, oferecendo cursos e workshops nas diversas áreas de atuação da acústica.
AECweb - Qual a atuação da entidade em relação às normas técnicas?
Akkerman - A ProAcústica participa ativamente da revisão das normas técnicas de acústica; na Comissão de Estudo de Desempenho Acústico de Edificações (CE-02:135.01); na Comissão de Estudo Especial de Acústica (CEE-196) da ABNT; na norma de desempenho (ABNT NBR 15575), com colaboração direta na sua revisão e adequação; no Dia Internacional da Conscientização sobre o ruído, realizado em abril; e trazendo para o debate público a necessidade de mapeamento acústico das cidades brasileiras, como forma de melhor gerir as grandes problemáticas relativas ao ruído urbano, entre outros temas.
AECweb - É possível mensurar a colaboração da ProAcústica na contenção do ruído nas grandes cidades brasileiras?
Akkerman - Conter o ruído nas grandes cidades é trabalho de longo prazo e depende da implementação de instrumentos ainda desconhecidos no planejamento urbano no Brasil, como a proposta divulgada pela ProAcústica de mapeamento acústico. Trata-se de ferramenta de apoio ao planejamento e ordenamento urbano, com vista à redução e gestão de ruído nas cidades. Assim, as prefeituras podem elaborar planos e estabelecer regras para exploração de atividades com emissões sonoras significativas, ou interditá-las, quando o ruído exceder os valores regulamentares.
AECweb - A sociedade já discute o uso deste instrumento?
Akkerman - A ferramenta tomou impulso a partir da Conferência Municipal sobre Ruído, Vibração e Perturbação Sonora, realizada recentemente através de parceria entre a ProAcústica e a Câmara Municipal de São Paulo. O tema deverá representar mudança significativa na qualidade de vida nas cidades, impactando não somente o mercado de acústica ambiental, mas também das edificações, pois a gestão do ruído urbano visa orientar a Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LPUOS), além de servir de base para o Estudo de Impacto de Vizinhança e Relatório de Impacto de Vizinhança (EIV/RIV) em casos de licenciamento.
AECweb - A entrada em vigor da ABNT NBR 15575 foi decisiva para agregar conforto acústico às construções?
Akkerman - Sem dúvida a norma de desempenho, que entrou em exigibilidade em julho de 2013, é um dos instrumentos para a melhoria da especificação, projeto e construção, com destaque para o conforto acústico. Será preciso que todos os agentes envolvidos incorporem efetivamente essa nova cultura às práticas de desenvolvimento de novos empreendimentos residenciais e, assim, agregar de fato, o conforto acústico às edificações.
ECweb - Fornecedores de um lado, construtoras de outro. Qual o elo da cadeia que melhor se apropriou da norma de desempenho?
Akkerman - A indústria fornecedora da construção civil deve se aprimorar na caracterização de seus produtos e sistemas, por meio de ensaios que demonstrem o desempenho de cada um. Já as construtoras estão buscando incorporar as soluções acústicas no dia a dia de seus projetos e obras, de maneira a atender ao que prescreve a norma. De forma geral, todos têm muitas adaptações a fazer neste processo de apropriação e aplicação da norma de desempenho, a fim de garantir o resultado mais adequado e assegurar o direito dos consumidores.
AECweb - Até que ponto a sociedade já tomou consciência do seu direito ao conforto acústico dentro de casa?
Akkerman - Apesar da grande dificuldade de saber para quem reclamar, os usuários vêm manifestando há tempos suas insatisfações com o desconforto acústico nos edifícios residenciais. Mas, de forma geral, a tomada de consciência do direito ao conforto acústico vem acompanhada de um processo de educação, informação e esclarecimento. Todos os envolvidos precisam contribuir para que a qualidade acústica nas edificações, e no meio ambiente, contribua de fato para a melhoria do bem-estar e da saúde pública, direito de todo cidadão.
AECweb - Crescem os segmentos da indústria que produzem sistemas e materiais destinados à redução do ruído? Quais?
Akkerman - Mais do que crescer, o que se constata num horizonte de médio prazo é a adequação da indústria no que diz respeito aos seus produtos/soluções destinados ao controle ou redução do ruído. Com certeza existirá espaço para a entrada de novos fornecedores. Qualidade, competitividade e informação técnica serão diferenciais importantes para a presença de novos players na indústria.
AECweb - Quais as soluções projetuais que estão e estarão em alta para responder às exigências de desempenho acústico?
Akkerman - Na verdade, nada de muito novo. O mercado deve se preparar para especificar as soluções mais adequadas nos diferentes tipos de projetos arquitetônicos para adaptação às exigências normativas. Outra medida importante é caracterização da ‘paisagem acústica’ dos terrenos e entornos dos futuros empreendimentos, estudo que ajuda a definir quais as soluções para fachadas, vedações e medidas para atenuação dos ruídos locais. Para o segmento econômico há uma demanda maior de inovações em relação ao desempenho de pisos em relação aos ruídos de impacto.
AECweb – Onde estão os pontos mais frágeis para atingir o desempenho previsto em normas, no projeto ou na construção?
Akkerman - No Brasil, ainda há um desconhecimento sobre como especificar desempenho e a respeito dos requisitos de acústica. Nesse momento inicial da exigibilidade da norma de desempenho, ainda há muitas dúvidas a respeito da quantificação e das soluções acústicas para alcançar as exigências. Será preciso um grande esforço da cadeia produtiva da construção no sentido de caracterizar produtos e sistemas. Será preciso, por exemplo, ensaiar não apenas o bloco de alvenaria, mas o sistema de parede, com todos os intervenientes, como janelas, portas e os demais componentes, a fim de obter o desempenho acústico real da tipologia adotada. Os projetistas terão de especificar com mais conhecimento e os fabricantes terão de adquirir a cultura do ensaio, a fim de definir níveis de desempenho de seus produtos e sistemas.
AECweb – Neste cenário, qual o papel de cada elo da cadeia produtiva?
Akkerman - Profissionais de projeto estão, de fato, diante de uma questão inerente à sua atividade, que é a responsabilidade técnica pelo que projetam e especificam. As construtoras, por sua vez, responsáveis pela viabilização dos projetos, precisam garantir o desempenho do que executam. A cadeia de fornecedores também está em uma situação de pressão para atender às novas necessidades de mercado, principalmente os fabricantes de portas, janelas e blocos de alvenaria, que precisam desenvolver soluções e ensaiar seus produtos.
AECweb – Além da norma de desempenho, quais as normas prescritivas de acústica que o arquiteto deve conhecer?
Akkerman - Basicamente as duas normas específicas de acústica que se aplicam à indústria da construção civil, a ABNT NBR 10151 e ABNT NBR 10152. Porém, desde 2013, a ProAcústica vem promovendo cursos sobre a norma de desempenho e a acústica, a fim de orientar os profissionais na aplicação dos quesitos da norma e de melhorar o desempenho acústico das edificações.
AECweb – Em quais casos é indispensável o projeto contar com consultoria de acústica?
Akkerman - Com a norma de desempenho, no mínimo, uma consultoria de acústica deve estar contemplada nos empreendimentos para verificação e classificação objetiva dos terrenos, além da análise e adequação das vedações externas e internas.
AECweb – Quais as suas perspectivas em relação ao futuro da acústica no Brasil, considerando a geração de ruído e a produção de edificações com melhor desempenho acústico?
Akkerman - O setor de acústica já registra um crescimento e a norma de desempenho, por exemplo, é um dos grandes propulsores dessa demanda. A procura por especialistas em acústica vem aumentando e em todo o país se multiplicam os pedidos de avaliações, ensaios de desempenho acústico e simulação de desempenho, por meio de softwares, para edifícios em fase de projeto. A indústria fornecedora de produtos e sistemas, por sua vez, irá também contar com um grande incremento. Além disso, quanto mais se expandem os centros urbanos, maior tende a ser o desenvolvimento da acústica ambiental no Brasil, pois são cada vez mais numerosas as fontes de ruído presentes nas cidades.
Colaborou para esta matéria:
Davi Akkerman - Engenheiro civil formado pela Universidade Mackenzie, com mestrado no Institute of Soundand Vibration Research, de Southamptom (Grã Bretanha). Tem especialização em Controle de Ruído Industrial pelo IPT. É membro eleito do Institute of Accoustic (Grã Bretanha) e diretor da Harmonia Davi Akkerman + Holtz, escritório de consultoria e projetos acústicos. Exerce seu segundo mandato como presidente da ProAcústica – Associação Brasileira para a Qualidade Acústica.

Fonte: http://www.proacustica.org.br/noticias/clipping-sobre-ac%C3%BAstica-e-temas-relacionados/conforto-acustico-nas-edificacoes-depende-de-nova-cultura-e-acao-integrada.html

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Norma da ABNT que determina isolamento acústico nos edifícios entra em vigor no dia 19 de julho

Indústria apresenta as mantas de polietileno como solução com melhor relação entre desempenho, durabilidade e custo para a nova exigência





Norma da ABNT que determina isolamento acústico nos edifícios entra em vigor no dia 19 de julho


Som de passos, animais, crianças pulando, o arrastar de móveis e a televisão alta são reclamações constantes para quem mora em prédios, o que faz com que o barulho esteja entre os principais problemas dos condomínios. No entanto, esta briga já tem data para acabar. A partir do próximo dia 19, as construtoras de todo país terão de seguir a norma ABNT 15575 que estabelece requisitos mínimos de desempenho acústico em novas edificações e determina que os apartamentos poderão receber, no máximo, 40 decibéis de ruídos externos.

Entre as novidades que estão sendo desenvolvidas pela indústria para este novo cenário, as mantas expandidas depolietileno são uma solução para a redução de ruídos entre os andares e se apresentam como o melhor custo-benefício oferecido pelo mercado. Produzidas pela Multinova, com apoio da Braskem, as mantas de polietileno são aplicadas entre a laje e o contra piso, proporcionando a redução de ruídos entre os andares. O produto é feito em polietileno, o plástico mais usado no mundo, através de um processo controlado de extrusão e expansão do material, o que torna a solução mais leve e com maior durabilidade. 

O custo da manta com cinco milímetros é de pouco menos de R$ 3 por metro quadrado, três vezes menor do que o de outros materiais com a mesma função. Em um apartamento de 100m², por exemplo, o valor investido no isolamento de áreas secas seria de cerca de R$ 200 reais. A instalação em uma área de 70m², por exemplo, demora em média 1,5 hora. Isto porque a aplicação também é mais rápida, já que não necessita de aparelhos ou manuseio especial, o que não interfere no tempo de entrega da obra.

Com cinco ou dez milímetros de espessura, as mantas de polietileno expandido não se degradam em contato com a umidade, seguem um rigoroso controle de qualidade e têm sua eficiência e durabilidade comprovada através de ensaios técnicos realizados no IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas e no Laboratório da CSAE da Itália. A matéria-prima também tem sua origem certificada. Por suas qualidades, o produto é utilizado ainda em prédios que buscam a certificaçãoLEED (Leadership in Energy and Environmental Design), selo de maior reconhecimento internacional na orientação ambiental de edificações. 

“A manta de polietileno é a alternativa mais eficiente e resistente disponível no mercado de isolamento acústico. É preciso que as construtoras e os novos proprietários fiquem atentos aos produtos que garantam um bom desempenho e o conforto necessário”, afirma Jorge Alexandre, responsável por desenvolvimento de mercado de PE da Braskem.

De acordo com Jair da Rosa, gerente comercial corporativo da Multinova, com as novas regras estabelecidas pela ABNT, a demanda da construção civil irá aumentar muito. “Por conta disso desenvolvemos um produto de qualidade para o mercado, atestado e diferenciado através da personalização e características técnicas como Densidade e Creep, mantendo o custo inferior aos produtos similares comercializados devido às características do Polietileno e à capacidade produtiva/hora e estoque das Unidades Fabris da Multinova”, destaca. 


Fonte: CDN Comunicação Corporativa 

terça-feira, 9 de setembro de 2014


Estudo de caso: As regras tácitas da construção nas favelas
© Solène Veysseyre 
 © Solène Veysseyre
" A construção de uma casa custa tempo e dinheiro", disse Marcio, um morador do Complexo do Alemão, uma das favelas do Rio de Janeiro, enquanto me mostrava sua casa. É por isso que uma casa leva várias gerações para ser construída: uma laje é construída, colunas erguidas e uma cobertura leve é instalada, mas isso é apenas para marcar onde o próximo pedreiro deve continuar seu serviço. "Construir uma cobertura com telhas não é um sinal de riqueza aqui - pelo contrário, significa que não se teve dinheiro suficiente para continuar construindo a casa", explica Manoe Ruhe, um urbanista holandês que morou nessa favela durante os últimos seis meses.
Como um arquiteto que sempre foi fascinado pela maneira que as pessoas vivem, tive que vir fazer uma residência no Barraco #55, um Centro Cultural no Complexo do Alemão, para aprender como seus cidadãos faziam para construir suas comunidades. E eu tinha muitas perguntas: existem regras de construção? Quais são as características em comum de cada casa? Elas seguem a mesma tipologia? Como é o interior dessas casas? Quais técnicas de construção e quais materiais são usados?
Favela55_house_c_panorama     
  Fotomontagem da casa de Márcio. Imagem © Solène Veysseyre
Marcio cresceu numa casa térrea, com telhado em duas águas que seu pai construiu. Há vinte e cinco anos, ele construiu um pavimento sobre a casa; hoje voltou a colocar a mão na massa para construir um segundo pavimento pavimento.
Eduardo está numa situação parecida - está tentando construir sua própria casa sobre a casa de sua mãe: "Eu fiz duas áreas separadas, uma onde eu moro e outra menor para alugar, ou para um estúdio de música." Isso é comum na favela, onde uma família aluga diferentes pavimentos de suas casas para outras famílias ou para seus parentes. Casas voltadas para a rua principal tendem a utilizar o térreo para atividades comerciais.
Favela55_solene_veysseyre_house_c   
   Casa. Imagem © Solène Veysseyre
Os materiais construtivos das casas devem obedecer três critérios principais: baixo custo, leves o suficientes para serem carregados nas costas dos pedreiros e pequeno o bastante para passar pelas vielas da favela. Como resultado, todas as casas são construídas com tijolos, pilares de concreto compõem a estrutura, as lajes são de vigotas e blocos cerâmicos e a cobertura quase sempre em telhas de amianto.
Favela55_solene_veysseyre_materials_a   
    Vigotes e tijolos. Image © Solène Veysseyre
Algumas pessoas contratam pedreiros, sobretudo para as tarefas mais específicas - como a moldagem de lajes ou a instalação do telhado. Mas muitos constroem suas casas com a ajuda de amigos, que dão uma mãozinha nos finais de semanas. Algumas vezes ocorre o escambo - Eduardo pegou os azulejos da fachada da casa de um amigo em troca de janelas.
Ao passo que não existem regras oficiais de construção, existe uma lei de respeito mútuo. Eduardo me contou que decidiu não instalar uma janela em seu dormitório pois ela abriria diretamente para a casa do vizinho. Afinal, a favela é um mundo pequeno, onde todos se conhecem e conversam com todos, logo devem ser estabelecidos acordos pacíficos entre si. Dito isso, um pavimento extra quase sempre vai obstruir a vista do vizinho - neste caso, é comum deixar um espaço de pelo menos um metro entre cada casa.
Favela55_sara_ulloa_view_a   
 © Sara Ulloa
Enquanto os exteriores das casas de tipologia mais comercial podem ser pintados ou revestidos com azulejos, em geral, as casas são mais austeras: quase todas deixam o tijolo aparente para a rua, com aparelhos de ar condicionado e antenas penduradas nas paredes, uma ou duas caixas d'água instaladas nas lajes de cobertura para garantir água corrente e janelas protegidas com grades de segurança, frequentemente com desenhos ornamentais.
Favela55_solene_veysseyre_house_a   
 Casa. Imagem © Solène Veysseyre
Os interiores, por sua vez, são outra história. Em geral, os espaços internos são bem cuidados e limpos, pintados e decorados, e quase todos possuem grandes televisões como elemento central. Azulejos são frequentemente utilizados nas fachadas, paredes, escadarias e pisos. Está na moda agora revestir o piso da laje de cobertura - um terraço utilizado para lavar e secar as roupas e também para reuniões sociais - com azulejos que imitam o padrão do calçadão de Copacabana. As paredes internas da laje-terraço também são pintadas em cores particularmente brilhantes: azuis, verdes, roxos e amarelos.
Favela55_solene_veysseyre_interior_b      
 Interior. Imagem © Solène Veysseyre
No entanto, os espaços internos tendem a ser um pouco escuros: os modelos típicos de janelas, feitas de policarbonato com esquadrias em alumínio, são pequenas. Isso se deve ao custo, mas também para proteger os interiores do sol e chuva intensos do clima tropical do Rio de Janeiro.
Favela55_solene_veysseyre_interior_c  
   Vista a partir do interior. Imagem © Solène Veysseyre
À primeira vista, as favelas - para mim - eram uma massa caótica impressionante: ondas de casas que invadiam cada espaço livre. No entanto, eu estava enxergando com olhos acostumados a ver ruas delineadas, espaços abertos e organizações formais. Tive que me adaptar a um novo mundo, um mundo de ruas estreitas, vielas e escadarias inclinadas, de janelas pequenas voltadas para becos escuros onde fios elétricos se entrelaçam. Uma vez adaptado, pude ver como a favela segue suas próprias regras, sua própria lógica e seus próprios códigos.
Favela55_section_low  
Corte da "A House" e seu entorno. Imagem © Solène Veysseyre

Este artigo foi originalmente escrito por Solène Veysseyre, um arquiteto francês que trabalhou em Bruxelas, Bélgica e Santiago do Chile.

Fonte:Veysseyre, Solène . "Estudo de caso: As regras tácitas da construção nas favelas" [Case Study: The Unspoken Rules of Favela Construction] 22 Aug 2014.ArchDaily. (Gabriel Pedrotti Trans.) Accessed 23 Ago 2014. http://www.archdaily.com.br/br/625874/estudo-de-caso-as-regras-tacitas-da-construcao-nas-favelas?utm_source=ArchDaily+Brasil&utm_campaign=27a722a919-Archdaily-Brasil-Newsletter&utm_medium=email&utm_term=0_318e05562a-27a722a919-407774757

Baixe a versão online do livro "A Obra em Aço de Zanettini"

Neste livro, o arquiteto se restringe a separar do universo da produção aquelas experiências que integram a prática e a teoria de cada projeto ou obra e que utilizam a solução em aço com aspectos relevantes dessa tecnologia. Ele mostra como cada obra ou projeto marcou aquela trajetória e de onde extraiu pontos significantes para a abordagem adotada.

Baixe aqui: http://issuu.com/fe3x5/docs/obra_em_a_o_de_zanettini

LULA, DILMA, MARINA E A VINGANÇA DE WEBER



 [Igor Suzano Machado]
A disputa pela Presidência da República no Brasil de 2014 parecia fadada à monotonia. Se os acontecimentos de meados do ano passado pareciam pode dar a ela maior agitação, as primeiras pesquisas eleitorais trataram de dissipar essa impressão. Até que, pela pior via possível, embarcada numa tragédia aérea de grande comoção, a incerteza política aportou no pleito presidencial presente, fazendo da emergência da candidatura de Marina Silva a faísca que faltava ao incêndio da disputa.
Difícil saber até que ponto a tragédia em si contribuiu para a grande ascensão de Marina nas intenções de voto. A julgar pelas primeiras sondagens de sua candidatura antes das eleições, provavelmente o que houve foi apenas uma reativação de um capital político já possuído pela candidata. Já se havia perquirido, inclusive, que a candidata era a figura política menos desgastada e mais beneficiada pelas manifestações de junho/julho de 2013. E não custa lembrar que, em momentos de desencanto com a realidade, desde o romantismo à new age, fugas pela espiritualidade e pela natureza são um caminho tradicionalmente percorrido. Logo, não é de todo surpreendente que a figura messiânica da ambientalista evangélica de origem humilde desponte como possível cabedal de uma liderança carismática, capaz de reencantar uma política desacreditada.
A emergência do carisma como forma de reencantamento da política nacional, tem-me remetido a um autor óbvio, quando se pensa neste tema: Max Weber. Um autor que sempre destacou como a vocação científica exigia saber que as descobertas da ciência estavam fadadas à superação, mas cujos ensinamentos, quase um século depois de sua morte, parecem longe de serem superados. Lembro-me de um ilustre professor que, prestes a citar Weber, antecipou a citação dizendo que iria fazer referência a um autor cujas contribuições eram em grande medida importantíssimas, ou, em alguns casos, mesmo definitivas. Parece que, como um bom clássico, Weber, intempestivo, insiste em se fazer presente também na disputa presidencial brasileira de 2014.
Na verdade, sinto que sua presença vem desde as eleições de 2010, quando se fez presente, paradoxalmente, pela sua negação. Como numa peça que se desenrola em vários atos, Weber foi um antagonista relegado a segundo plano no ato de 2010, que parece disposto a emergir mais nitidamente no ato de 2014, talvez para uma vingança imediata, talvez para uma reconciliação, ou talvez para um novo embate que prorrogue a peça até novo ato em 2018.
Lembro-me de duas lições weberianas que me fizeram estranhar a audácia da tática eleitoral do Partido dos Trabalhadores na sucessão presidencial de 2010. A primeira é que, ao contrário da tradição, o carisma não se transfere. E a segunda é que o embate parlamentar é o terreno propício para o florescimento de lideranças políticas, enquanto que a burocracia, com sua lógica de obediência sistemática a ordens de origem outra, aparece como possivelmente o mais estéril dos solos para a emergência de tais lideranças, que possuem como características fundamentais a criatividade e a responsabilidade pelas próprias decisões. Não é necessário lembrar que Dilma representava o oposto disso. Um “poste”, nos dizeres de alguns críticos, alçada do burocratismo à situação de liderança política por um genuíno agente do carisma, que acreditava ter brilho próprio suficiente para contaminar sua escolhida.
Claro que a metodologia weberiana, que utiliza os famosos “tipos ideais” ou “puros”, faz com que, quando Weber fala de políticos e burocratas e formas de dominação baseadas no carisma ou na tradição, ele se refira a personagens idealizados, radicalizando algumas de suas características típicas. Logo, o presente texto também recorre a tais extremos para ressaltar suas diferenças, sem querer ignorar a complexidade dos casos específicos, que não pode ser abordada em detalhe aqui. Ou seja: é lógico que a liderança de Lula não é puro carisma, e que uma militante de anos como Dilma não pode ser considerada exatamente uma burocrata. Ainda assim, acredito que esses traços gerais ajudem a compreender o contexto e identificar os pontos de embate entre aquelas que emergem atualmente como as principais postulantes à Presidência da República no Brasil: Dilma e Marina.
Mas voltando ao pleito de 2010, confesso que eu mesmo, como espectador ludibriado pelos protagonistas do ato, acreditei, principalmente após a vitória de Dilma, que a estratégia de Lula e do PT era correta. Afinal, os embates políticos, na mesma medida que fortalecem um candidato, também podem desgastá-lo, aumentar sua rejeição, etc. Além disso, novas tecnologias de comunicações e pesquisas de sondagem do eleitorado pareciam ser capazes de operar algum nível se não de transferência de carisma, de criação de carisma novo, com base no antigo. Contudo, autores que se sagram como clássicos não o fazem à toa e parece que em 2014 a estratégia cobra seu preço, com Weber espreitando ao fundo. Em contexto econômico e político menos favorável, cobra-se da política seu lado menos pragmático e administrativo: cobra-se dela sua dimensão criativa e de orientação dos espíritos. Enfim, retomando mais um tema caro a Weber, o desencantamento do mundo cobra uma saída. E, como Weber sabia bem, a liderança carismática que, por definição, é completamente arisca à rotinização, é, em termos de dominação política, a única que oferece essa saída.
Com isso, Dilma parece estar em apuros por ter de enfrentar algo que ela não era e não conseguir ser: uma liderança política genuína, como é o caso de Marina Silva. Um embate direto no segundo turno, pode deixar tais diferenças mais nítidas. E talvez seja já o ato da peça em que Weber se vinga de Lula e faz com que a escolhida do ex-presidente sucumba diante da “escolhida por Deus” – como nas mais genuínas lideranças carismáticas – treinada nas trincheiras parlamentares de uma Câmara dos Vereadores, uma Assembleia Legislativa e um Senado Federal.
Mesmo assim, essa não é a exposição por inteiro do quadro político atual, mesmo sob uma perspectiva weberiana. Weber, como todo clássico, também é mais complexo do que isso e sua sociologia dos partidos políticos, reconhecidos como verdadeiras máquinas racionalizadas para a obtenção de cargos públicos, caminha a socorro da atual presidenta. É esse maquinário pautado pela eficiência racional que pode atuar a favor de Dilma, já que ela conta com um suporte partidário muito mais poderoso que sua rival. E, como o primeiro debate entre os presidenciáveis já mostrou, ainda que com alguma dificuldade, também verificada no debate, Dilma pode ser treinada para superar os desafios de campanha que se lhe apresentam. Além disso, mais uma vez tendo como referência o debate da última terça, seja por capacidade própria, seja por capacitação partidária, é possível a um candidato hábil explorar os pontos fracos de Marina, inclusive por meio de uma ética da responsabilidade weberiana, não obstante o apelo que candidata possa ter para aqueles “contra tudo isto que está aí”.
Este seria o caminho de reconciliação com Weber, ou o uso de Weber contra ele mesmo, como antídoto ao seu próprio veneno, possível de ser encontrado na obra de um autor que começava entender como a política possui uma importante dimensão autoimune. Afinal, conformação à jaula de ferro, contra o apelo do potencial transformador, mesmo que possivelmente irresponsável, do carisma, não é exatamente uma postura anti-weberiana, sendo Weber um autor plenamente ciente dessas contradições. Não obstante, essa reconciliação interna a obra de Weber, por via da sociologia dos partidos e de A política como vocação – e não pela via da sociologia da dominação e deParlamentarismo e governo numa Alemanha reconstruída – poderia apenas adiar o embate para outro ato, nas eleições de 2018.
Nesse caso, a vingança de Weber poderia mesmo guardar um elemento sádico. No caso de uma, a meu ver, pouco provável, candidatura de Lula, poderia acontecer de um dos principais articuladores da candidatura anti-weberiana de Dilma ser a vítima direta de uma tentativa de reencantamento da política, para a qual, outrora, o próprio aparecera como agente privilegiado pela ação do carisma. Contudo, num contexto de passados dezesseis anos de governo de seu partido, a rotina e uma conjuntura econômica e política desfavorável poderiam corroer essa aura carismática e fazê-lo sucumbir à emergência de uma nova liderança política em ascensão. Quem sabe a própria Marina, para completar a ironia e o sadismo, ex-ministra de Lula.
Obs.: Este não é um texto a favor ou contra nenhuma das duas principais candidatas à eleição presidencial de 2014, com relação às quais eu teria divergências substantivas em ambos os lados. Não me propus aqui a discutir a substância das propostas das adversárias, única forma de se discutir esta questão. Apenas trouxe à tona algumas categorias de um autor clássico das ciências sociais que acredito serem úteis na compreensão do quadro político atual, já que, a meu ver, permitem avaliar pontos fortes e fracos das duas concorrentes, que não estão completamente subsumidos aos seus programas de governo, apesar de, obviamente, estarem, de alguma forma, relacionados a eles.
Criador de uma linguagem única, Burle Marx foi o primeiro a colocar o paisagismo em pé de igualdade com a arquitetura

Roberto Burle Marx sempre começava o dia com uma ronda pelos canteiros de seu refúgio particular, para onde se mudou em 1973 e permaneceu até sua morte, há 20 anos. Só saía do sítio Santo Antônio da Bica, nos arredores do Rio, depois de ver de perto como estavam suas plantas. “Ele rodava 60 quilômetros para chegar ao trabalho, e fazia isso diariamente”, conta Haruyoshi Ono, arquiteto que trabalhou por 30 anos com o paisagista e atualmente dirige o escritório que o amigo abriu na zona sul da cidade em 1955.
roberto burle marx, aisagismo da residência de edmundo cavanellas (1954), em petrópolis
Burle Marx comprou o sítio, hoje patrimônio da União, em 1949. Precisava de um lugar para produzir mudas e de mais espaço para sua coleção, iniciada na infância e multiplicada desde que descobriu a flora tropical brasileira no Jardim Botânico de Berlim. A transformação do sítio – descrito pelo crítico de arquitetura Paul Goldberger como “uma das mais belas paisagens criadas pelo homem no mundo” – se tornaria para Burle Marx um projeto de vida. “Ele demonstra lá o caráter único de sua arte, que era a um só tempo de grande amplitude, mas intimista”, disse o americano, após conhecer o local, em 2013.
Revelado tanto em trabalhos públicos, como o aterro do Flamengo (décadas de 1950 e 60), no Rio, quanto nos privados, como a residência Odette Monteiro (1948), em Corrêas (RJ), esse excepcional domínio do espaço é apontado por Sílvio Soares Macedo, professor titular da FAU-USP, como importante marca da prolífica trajetória do paisagista. “Burle Marx inovou ao colocar a vegetação tropical em primeiro plano. Desconstruiu o tradicional traçado de parques e praças românticos do século 19 e criou uma linguagem nova que tinha muito a ver com as formas orgânicas das artes plásticas, principalmente no que se referia ao desenho de pisos e águas e à combinação de cores das plantas”, explica.
Foi a convite de Lucio Costa, seu amigo de infância, que Burle Marx projetou os jardins do antigo Ministério da Educação e Saúde (1938), atual edifício Gustavo Capanema, no Rio – obra que se tornaria o marco do paisagismo moderno no Brasil e no mundo. Foi apresentado pelo urbanista a Oscar Niemeyer, com quem atuaria, entre outras criações emblemáticas, no Conjunto da Pampulha, em Belo Horizonte (1942), e no Itamaraty (1965). “Sempre que precisávamos de algo bonito, nós o chamávamos”, costumava dizer Niemeyer.
roberto burle marx, painel de azulejos de portinari e jardim suspenso do edifício gustavo capanema (1938), no rio
Igualdade 
Burle Marx foi o primeiro a colocar o paisagismo em pé de igualdade com a arquitetura, e não como complemento dela. Ele tinha uma concepção estética que unia extrema clareza com alto rigor botânico. Artista plástico por formação, era paisagista autoditada, designer de joias, tapeceiro e decorador de festas.
Chefiou diversas expedições das quais trazia vegetação ornamental para aclimatar em seu viveiro. “Quando doou seu sítio para o governo, ele deixou claro que a ideia era preservar as cerca de 3.500 espécies que aqui estão – algumas, ameaçadas de extinção”, afirma Marlon da Costa Souza, chefe da divisão técnica do Sítio Roberto Burle Marx.
Para Sílvio Soares Macedo, o fato de ter sido o arquiteto-paisagista do Estado e da elite permitiu a Burle Marx muitos recursos e total liberdade de criação, além de projeção no exterior. São de sua autoria, por exemplo, o Parque del Este (Caracas) e os jardins internos da Unesco (Paris). “Ele teve a chance de fazer trabalhos particulares belíssimos, como a residência Nininha Magalhães Lins (1974), no Rio, nos quais trabalhava a vegetação para criar planos, texturas e ambiências.” Na mesma cidade também estão importantes mosaicos de piso do paisagista, como o calçadão de Copacabana (1970).
Haruyoshi Ono acrescenta às mais importantes e preservadas obras do paisagista a Fazenda Vargem Grande (1979), em Areias (SP). “O jardim vertical do Banco Safra (1988), na rua Bela Cintra, em São Paulo, também estava entre os trabalhos mais queridos dele.”
O último projeto do qual participou, mas não chegou a ver pronto, foi o Kuala Lumpur City Centre (1994). “Para comemorar os 20 anos do parque, fomos convidados pelo governo da Malásia a fazer sua revitalização”, disse Ono. Nascido em 1943, o arquiteto, a exemplo do que fazia seu mestre, continua a ir todos os dias para o escritório.

Saiba mais

As visitas ao sítio Roberto Burle Marx devem ser agendadas pelo telefone 21 2410 1412.
Leia esta matéria também na seçãohomenagem do anuário bamboo.

Fonte: http://www.bamboonet.com.br/posts/criador-de-uma-linguagem-unica-burle-marx-foi-o-primeiro-a-colocar-o-paisagismo-em-pe-de-igualdade-com-a-arquitetura